O que queremos para a nossa Santa Casa?

OPINIÃO

O que queremos para a nossa Santa Casa?

Há um risco de colapso anunciado para maioria das Santas Casas, mas nós queremos andar na contramão da crise

Por Augusto Rios Carneiro*

Convido você a parar por alguns minutos e tentar imaginar como seria a sua cidade sem um hospital? Dada a importância do serviço prestado por uma Santa Casa, tentar imaginar uma cidade sem esse tipo de assistência, nos parece o início de um caos instalado na saúde pública.

Um artigo publicado recentemente na Folha de São Paulo e escrito pelo diretor-presidente da Federação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos do Estado de São Paulo (Fehosp), Edson Rogatti, expõe a situação atual desses hospitais, que iniciaram o ano de 2013 com dívidas de R$ 12 bilhões. Um cenário lamentável e preocupante.

Assusta-nos ainda mais pensar que, nessas condições, muitas instituições não sobreviverão até 2014. E como planejar o futuro de um município sem a prestação de serviço hospitalar para a recuperação da saúde do cidadão? Diminuir sensivelmente o volume dos atendimentos prestados ao SUS é uma das soluções possíveis, apontadas pelos gestores dessas instituições. Mas como olhar para nossas crianças e outros milhares de pessoas que dependem do Sistema Único de Saúde para ter acesso ao atendimento digno, e que lhes é de direito?

Por outro lado, essas instituições não têm mais condições de continuar adquirindo dívidas. E esse passivo crescente, é importante esclarecer, existe porque o SUS deixou de cumprir suas obrigações no acordo que celebrou com as instituições filantrópicas para viabilizar sua criação. Naquela época, o Estado não tinha – e ainda não tem – estrutura suficiente para oferecer o atendimento público e universal que propõe a Constituição.

Atualmente, a cada R$ 100,00 gastos na assistência pública, apenas R$ 65,00 são ressarcidos pelo governo. Uma diferença que é ainda maior nos atendimentos de média e baixa complexidade. E quem paga o restante dessa conta? As próprias Santas Casas, que contraem dívidas para manter as suas portas abertas, sem interromper a assistência necessária ao paciente. Em Itapeva, a nossa Santa Casa, também não fechou o ano de 2012 como almejava. Repasses deixaram de ser feitos pela prefeitura e isso só fez aumentar o saldo negativo.

Mesmo com tantos esforços, vez ou outra recebemos críticas da população, que se manifesta insatisfeita com o atendimento oferecido pela Santa Casa. Porém, mesmo sem receber as verbas afirmadas nas contratualizações acordadas com o município de Itapeva; mesmo sem receber qualquer ajuda de custo dos municípios vizinhos que utilizam o nosso serviço; permanecemos trabalhando 24 horas por dia, sete dias por semana, oferecendo à população atendimento na baixa, na média e na alta complexidade. Nunca falta médico no Pronto Socorro. Nunca falta equipamento necessário para exames e diagnósticos adequados. Nunca falta leito para o doente que nos procura. Ainda assim, isso tudo não parece suficiente para atender as angústias de um povo que ainda não sabe quão importante e fundamental é o papel que esta Santa Casa desempenha.

Sabem o que é viver sem um hospital aqueles netos que um dia tiveram a oportunidade de ouvir as histórias contadas por seus avós, nos idos de 1904, quando a Santa Casa foi obrigada a fechar suas portas por falta de recurso. Mas hoje, quando já contamos há 113 anos com um hospital bem estruturado, nem sempre damos o devido valor.  Contamos com uma estrutura cada vez mais apropriada às necessidades da população, com avanços físicos, tecnológicos e profissionais que, diga-se de passagem, podemos nos orgulhar, é escasso até num raio de 200 km. Mas, fazendo uma reflexão dura e sombria, é possível imaginar o caos instalado na saúde pública de Itapeva sem os serviços oferecidos pelo Pronto Socorro da Santa Casa de Itapeva?!

A Administração e a Diretoria da Santa Casa, juntamente com seus colaboradores, trabalham diuturnamente para driblar as dificuldades financeiras e tentar andar na contramão da crise vivenciada pela maioria dos hospitais em todo o país. Apoiamos o movimento Tabela do SUS – Reajuste Já, que faz reivindicações consideradas básicas e indispensáveis junto aos governos estadual e federal, vislumbrando o início de uma recuperação financeira e o reajuste de 100% da tabela atualmente praticada pelo SUS.

Enquanto cidadãos, nós também podemos fazer a nossa parte nos mantendo informados sobre as ações da Santa Casa e cobrando o poder público para que medidas emergenciais sejam tomadas, além de compreender seu papel como mera prestadora de serviço ao município: uma instituição filantrópica que depende de verbas do SUS para oferecer atendimento gratuito e de qualidade, um direito de qualquer cidadão.

*Augusto Rios Carneiro é professor aposentado
e atual Provedor da Santa Casa de Misericórdia de Itapeva